Um livro é um mudo que fala, um surdo que responde, um cego que guia, um morto que vive. (Padre Antônio Vieira)

sexta-feira, 26 de março de 2010

Pelo direito de assistir à TV em paz

Por Ale Rocha . 26.03.10 - 16h30

Após tomar estádios de futebol e o trânsito, entre outros espaços de convivência, a TV é a bola da vez para a expressão da violência. Os telespectadores enlouquecem por qualquer motivo. Comentários sobre uma atração são transformados em algo ideológico. Se quem lê o que eu escrevo concorda, sou laureado com elogios. Se o leitor ou a leitora discorda, sou chamado de imbecil para pior.

Boa parte da população está à beira de um ataque histérico. Junte a isso o irritante comportamento politicamente correto e a inabilidade em lidar com o contraditório. Temos uma bomba-relógio.

É deplorável esta atitude de muitos telespectadores. Independe de classe social e econômica. O que deveria ser um entretenimento saudável virou combustível para ameaças e intolerância. O ringue preferido é a internet.

Há pouco mais de duas semanas, Hebe retornou à TV. Enquanto a apresentadora emocionava por sua garra contra o câncer, o humorista, Danilo Gentili, do "CQC", soltou uma piada no Twitter: "Assistam! O SBT está reprisando agora 'O Retorno da Múmia'."

Alguns apenas acharam a piada sem graça e tocaram a vida. Foi o que fiz, aliás. Outros decidiram colocar Danilo Gentili de cabeça para baixo na cruz. Ofensas pessoais e profissionais ao comediante foram publicadas aos montes. Surgiu até mesmo uma campanha para sua defenestração do "CQC".

Nesta semana, após denunciar o desvio de um televisor no quadro "Proteste Já", Danilo Gentili foi elevado à condição de justiceiro e salvador da pátria por muitos que o queriam na cruz dias antes.

 

As alianças mudam dentro do BBB 10

Como se pode observar, não há meio termo. Tudo é divido em forças opostas e incompatíveis.

Outro combustível para a violência é o "BBB 10″. Um elogio ou crítica a qualquer participante pode custar caro. Comentar uma atitude de Dourado ou Dicesar é perigoso. Dependendo da posição, rapidamente a análise será definida como homofóbica, hipócrita ou preconceituosa. Em alguns casos, até mesmo nazista (eu não escapei dessa).

Aqueles que defendem ou agridem não verão a cor do dinheiro em disputa. Sequer terão a oportunidade de conhecer o vencedor. Uma batalha inexpressiva que não leva a lugar algum.

Este comportamento agressivo e maniqueísta nada mais é do que a expressão de neuroses. Todos projetam em um programa de TV a harmonia que não têm em suas vidas. Grande parte da população vive angustiada em relacionamentos opressores, sejam eles profissionais ou pessoais. Predomina a frustração com o cotidiano.

Neste cenário, a internet surge como ferramenta de catarse. Sob o pretenso anonimato ou a falsa segurança de um botão que apaga o que foi escrito, muitos perdem a autocrítica. A sensação de impunidade, tão presente no mundo real, migra para o ambiente virtual. O terreno é fértil para quem prefere destruir a construir ou que, na falta de capacidade para formular argumentos, apela para a desqualificação do interlocutor.

 

Aqui fora, telespectadores levam adiante uma batalha onde não há vencedores

Infelizmente, a presença forte do Estado e os anos de ditadura impedem que diversos brasileiros saibam lidar com a democracia e a liberdade de expressão. Chegamos ao ponto em que muitos acreditam ser necessário autorizar a opinião de outro, sob o risco de uma campanha #ForaFulano.

Assim, o que deveria ser um passatempo prazeroso, acaba se tornando uma dor de cabeça. Nem mesmo assistir à TV em paz é possível atualmente.

 

http://colunistas.yahoo.net/posts/911.html

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