Um livro é um mudo que fala, um surdo que responde, um cego que guia, um morto que vive. (Padre Antônio Vieira)

sexta-feira, 28 de março de 2008

Sobre o Prazer, de Nietzsche

O prazer, porém, não quer herdeiros, não quer filhos – o prazer quer a si mesmo, quer eternidade, quer retorno, que tudo eternamente igual a si mesmo. Diz a dor: “Despedaça-te, sangra, coração! Caminha, perna! Voa, asa! Para a frente! Para o alto! Oh, dor!” pois muito bem! Ânimo! Ó meu velho coração. -- A dor diz: “Passa momento!”
[...]
Dissestes sim, algum dia, a um prazer? Ó meus amigos, então o dissestes, também, a todo o sofrimento. Todas as coisas acham-se encadeadas, entrelaçadas, enlaçadas pelo amor. p. 376

[...] e também vós dizeis ao sofrimento: “passa momento, mas volta!” Pois quer todo o prazer – eternidade! p. 377


Referência

NIETZSCHE, Friedrich W. Assim falou Zaratustra: um livro para todos e para ninguém. Tradução de Mário da Silva. 12. ed. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2003. 381 p.

Álvaro de Campos - Sobre o Destino

CAMPOS, Álvaro de. Poesia. São Paulo: Companhia das Letras, 2002. p. 259

Arre...
[...]
Mas então isto não acaba?
É destino?
Sim, é o meu destino
Distribuido pelos meus conseguimentos no lixo
E os meus propósitos à beira da estrada -
Os meus conseguimentos rasgados por crianças,
Os meus propósitos mijados por mendigos,
E toda a minha alma uma toalha suja que escorregou para o chão.

Álvaro de Campos - Sobre Partir

CAMPOS, Álvaro de. Poesia. São Paulo: Companhia das Letras, 2002. p. 264

Porque é sempre de nós que nos separamos quando deixamos alguém,
É sempre de nós que partimos quando deixamos a costa,
A casa, o campo, a margem [...]
Tudo que vimos é nós, vivemos só nós o mundo.
Não temos senão nós dentro e fora de nós,
Não temos nada, não temos nada, não temos nada...

quarta-feira, 19 de março de 2008

Soneto de Camões

CAMÕES, Luís Vaz de. Sonetos de Amor. São Paulo: Landy, [200-]. 141 p.

Tomou-me vossa vista soberana
Aonde tinha as armas mais à mão,
Por mostrar a quem busca defensão
Contra esses belos olhos, que se engana.

Por ficar da vitória mais ufana,
Deixou-me armar primeiro da razão:
Bem salvar-me cuidei, mas foi em vão,
Que contra o Céu não vale defensa humana.

Contudo, se vos tinha prometido
O vosso alto destino esta vitória,
Ser-vos ela bem pouca, está entendido;

Pois, ainda que eu me achasse apercebido,
Não levais de vencer-me grande glória;
Eu a levo maior de ser vencido.

sexta-feira, 7 de março de 2008

Álvaro de Campos - Poesia

CAMPOS, Álvaro de. Poesia. São Paulo: Companhia das Letras, 2002. p. 418

São poucos os momentos de prazer na vida...
É gozá-la... Sim, já o ouvi dizer muitas vezes
Eu mesmo já o disse. (Repetir é viver.)
É gozá-la, não é verdade?

Gozemo-la, loura falsa, gozemo-la, casuais e incógnitos,
Tu, com teus gestos de distinção cinematográfica
Com teus olhares para o lado a nada,
Cumprindo a tua função de animal emaranhado;
Eu no plano inclinado da consciência para a indiferença,
Amemo-nos aqui. Tempo é só um dia.
Tenhamos o romantismo dele!
Sou qualquer nas palavras que te digo, e são suaves – e as que esperas.
[...]
Só tenho medo que me vás falar da tua vida...
[...]
Falo médias e imitações
E cada vez, vejo e sinto, gostas mais de mim [...]
Te segredo em segredo o que exatamente convinha.
[...]
Sorrio.
Por trás do sorriso, não sou eu.

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