Um livro é um mudo que fala, um surdo que responde, um cego que guia, um morto que vive. (Padre Antônio Vieira)

terça-feira, 30 de novembro de 2010

Observações de um formigueiro.

Como filósofo das pequenas coisas eu observo o que é invisível aos olhos. E nesta prática constante de observar procuro dali abstrair alguma experiência válida e não apenas um objetivo pré-fixado.

Deparei-me, numa destas observações minuciosas, com uma estranha transformação que vem ocorrendo na sociedade. Imperceptível por pequena que é, só um filósofo do pequeno é capaz de perceber. Mas não é na sociedade humana que esta micro-transformação está se dando. Ainda que seja na sociedade, é a das formigas que me dirijo.

Pois bem, notei com espanto que algumas formigas iniciaram uma ação de se separar do grupo. Elas ainda viviam bem próximas. Ao lado mesmo do grande formigueiro. Contudo este grupo excluso de formigas começaram a construir cada uma seu próprio formigueiro. Todos os formigueiros se ergueram próximos uns aos outros e do formigueiro mãe. Cada vez mais este fato vem ocorrendo com as formigas, vos alerto!

No decurso de muitos meses continuei observando com interesse esta estranha mudança na sociedade das formigas. Cada qual no seu próprio formigueiro começou então a trabalhar por si. Por sua própria conta. As formigas individualistas passaram a fazer seu próprio horário de trabalho que variava muito de formiga para formiga. Houve mudanças na preferência por alimentos também. Algumas preferiram insetos, outras folhas. Algumas delas preferiram dormir até mais tarde e coletar alimentos próximo ao pôr do sol, quando o dia estava mais fresco. Outras formigas coletavam muito cedo o alimento para então ter o restante do dia livre de responsabilidades. Com algum tempo livre, sem as responsabilidades coletivas, algumas passaram a exercer atividades de lazer como caçar, nadar e brincar. Elas por vezes se encontravam para o lazer, mas mantinha-se seus muros.

Eis que uma grande briga por espaço de coleta e morada se formou entre elas devido ao crescimento de formigueiros individuais, e então – veja que estranho – as formigas ergueram barricadas de areia, demarcando áreas.

Nas últimas semanas tenho visto uma mudança ainda mais drástica. As formigas estão perdendo a solidariedade entre os seus iguais. Quando a aldeia de formigas – pois já não é mais um formigueiro coletivo - é atacada por insetos ou animais, cada formiga procura se proteger por si só. Entram em fuga, escondem-se, fingem-se de mortas. Se olham uma formiga irmã ser atacada cruelmente por um inseto, ignoram o crime e se dão por contentes por terem a sorte de não ter sido com elas.

Cada formiga tem vivido por conta própria, porém elas mantém uma dependência mútua. Não sobrevivem sozinhas, isoladas umas das outras. Como filósofo me pergunto: porque então insistem nesse modo de vida individualista, mesmo sabendo que assim serão levadas a decadência e por fim a extinção?

Toda essa observação da natureza e sua dinâmica me fez temeroso. Então eu corri em direção a segurança da minha casa e passei a escrever o relato que gravei. Aviso aos leitores incrédulos que tenho todos estes fatos registrados em meu gravador de voz, logo posso provar. Eu gravava o meu relato ao mesmo tempo em que via ocorrer toda essa mudança com a sociedade das formigas.



Ass.: Alexandre, o pequeno.


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