Penso em ti no silêncio da noite, quando tudo é nada,
E os ruídos que há no silêncio são o próprio silêncio,
Então, sozinho em mim, passageiro parado
De uma viagem em Deus, inutilmente penso em ti.
Todo passado, em que foste um momento eterno,
É como este silêncio de tudo.
Todo o perdido, em que foste o que mais perdi,
É como estes ruídos,
Todo o inútil, em que foste o que não houvera de ser
É como o nada por ser neste silência nocturno.
Tenho visto morrer, ou ouvido que morrem,
Quantos amei ou conheci,
Tenho visto não saber mais nada deles de tantos que foram
Comigo, e pouco importa se foi um homem ou uma conversa,
Ou um povo omitido do mundo,
E o mundo hoje é para mim um cemitério de noite
Branco e negro de campas e árvores e de luar alheio
E é neste sossego absurdo de mim e de tudo que penso em ti.
PESSOA, Fernando. Poesia. Álvaro de Campos. Edição Teresa Rita Lopes. São Paulo: Cia. das Letras, 2002. p. 361
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