A morte recente de uma professora quando tentava salvar seu automóvel de uma enchente é sem dúvida trágica. Mas como toda tragédia que os gregos nos legaram, este fato nos traz algum ensinamento: ele é sintomático destes tempos ditos pós-modernos. A professora preferiu colocar sua vida em risco, ainda que sob os chamados de desencorajamento de algumas pessoas, para salvar seu carro. Mas para ela certamente não era somente um carro. Para que se atirasse em tamanho perigo era porque neste carro havia dispendido um bom dinheiro e uma vida de trabalho.
Contudo não se pode dizer que a professora quis a salvar sua vida que dedicou ao trabalho através do salvamento do carro. Ainda que salvando o veículo, a vida não se resgata, naturalmente. Mas se pode dizer que foi o dinheiro então que ela quis salvar, na possibilidade eminente da perda do veículo. Note que a possibilidade de perder um carro - ou um punhado de dinheiro fictício - e perder a própria vida são colocadas lado a lado, no mesmo patamar de valor. Pois a professora não só arriscava-se perder o carro como arriscava-se perder a sua vida, o que ocorreu, infelizmente.
Não obstante, ainda não era só dinheiro. O seu carro era seu espelho. Nele ela refletia seus valores. Valores efêmeros e de moda, valores forjados, transcendentes ao objeto, embutidos pelo marketing que aplica conscienciosamente a ciência com objetivo vil, para fins imorais. Foi, então, em nome de valores fictícios, forjados e efêmeros, valores que ela acreditava e por isso se atirou com tanta gana ao veículo. É como se o valores que ela atribuía ao seu carro e os que o carro atribuía a ela pudessem serem restituídos à proprietária se tivesse salvado o seu automóvel. Sabedoria chinesa: Salve-se antes de tudo.Alexandre, O Pequeno
Um livro é um mudo que fala, um surdo que responde, um cego que guia, um morto que vive. (Padre Antônio Vieira)
sexta-feira, 16 de março de 2012
Penúria simbólica e abundância material
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