GALEANO, Eduardo. As veias abertas da América Latina. Porto Alegre: L&PM, 2014.
Não deixam ver o que escrevo porque escrevo o que vejo.
Blas de Otero
A linguagem hermética nem sempre é o preço inevitável da profundidade. Em alguns casos pode esconder, simplesmente, a incapacidade de comunicação elevada á categoria de virtude intelectual. Suspeito de que assim o enfado, com frequência, serve para bendizer a ordem estabelecida: confirma que o conhecimento é um privilégio das elites. p. 370
Alguém escreve para tratar de responder às perguntas que lhe zumbem na cabeça, moscas tenazes que perturbam o sono, e o que alguém escreve logra um sentido coletivo quando de algum modo coincide com a necessidade social da resposta. p. 370
A veneração do passado sempre me pareceu reacionária. A direita elege o passado porque prefere os mortos: mundo quieto, tempo quieto. Os poderosos, que legitimam seus privilégios pela herança, cultivam a nostalgia. Estuda-se história como se visita um museu; e essa coleção de múmias é uma fraude. Mentem-nos o passado como nos mentem o presente: mascaram a realidade. Obriga-se o oprimido a ter como sua uma memória fabricada pelo opressor, alienada, dissecada, estéril. Assim ele haverá de resignar-se a viver uma vida que não é sua como se fosse a única possível. Em As veias, o passado sempre aparece convocado pelo presente, como memória viva de nosso tempo [...] se indaga o som e as pegadas dos passos multitudinários que presentem nossos passos de agora [...] os latino-americanos somos pobres porque rico é o solo que pisamos e que os lugares privilegiados pela natureza foram amaldiçoados pela história. Neste nosso mundo, mundo de centros poderosos e subúrbios submetidos, não há riqueza que pelo menos não seja suspeita. p. 370-371.
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